domingo, 21 de dezembro de 2008

Poesia

Por Annita Costa Malufe
sou capaz de chorar por falta de algumas palavras
acho que não li suficientemente tudo até aqui
duas horas estarei deitado em minha cama depois de uma
noite nas ruas mais uma noite como outras
não li suficientemente o que deveria sou
capaz de chorar por algumas palavras
que gostaria de ler estou sozinho numa noite
de natal as venezianas abertas e sem reconhecer o céu
a falta de algumas palavras seria só isto ou
só a veneziana entreaberta teus olhos entreabertos
ao meu lado sobre a cama teus cabelos cobrindo
o rosto o teu rosto inclinado entre as minhas pernas
a imagem que gravei as palavras que esqueci
por que choro por isto me pergunto mas lavo o rosto
sem pensar de novo mais uma noite não faz diferença
o que chamo de cama esta montanha de panos
sobre o chão de um quarto mal iluminado e um
céu que não reconheço

acho que estamos nos despedindo
não li tudo até aqui era o que eu pensava teria
de fazer a lição de casa melhor estamos nos
despedindo? mais uma vez? sim mais uma vez
mas agora é definitivo como todas as vezes
estamos nos despedindo a casa refeita vou
caminhar como você até a próxima rua não
não vou caminhar com você sou
capaz de chorar por falta de algumas palavras
seriam poucas veja só acho que estamos
mais uma vez nos despedindo fico por aqui
meu dorso inclinado teus cabelos sobre
as minhas coxas gravo as imagens mais do que
as palavras esta montanha de panos imaginar
a vida sem você estamos nos despedindo
mais uma vez não pude ler tudo suficientemente

antes mesmo do sono chegar são
seus cabelos que se espalham sobre as pernas
as que não tenho mais antes mesmo
do sono antes as portas estão vigiadas a
solidez dos cadeados como uma ressaca de mar
a viagem entre caminhos que a água cava
na areia o sal a vivência que adere à pele antes
mesmo do sono chegar estou acordado
perambulando novamente estou respondendo
a alguém que me chama na rua em frente estou
procurando minhas pernas as que perdi
entre águas o sal a solidez que retorna
calcário mar antes são as imagens um mar
de cabelos sobre as pernas o sono interrompido
a resposta estou indo o poste queimado
na rua em frente a beirada de uma guia
seguir os caminhos fincados no cimento em busca
das pernas onde estão onde você está quem
me chama na rua em frente no escuro da rua
em frente vigiada pelo poste queimado mesmo
antes do sono chegar desperto o corpo estaria morto
e como seria estar morto senão um gole o último
“quando me penso morto
penso em alguém fazendo amor com você
quando não estou por perto” penso
na solidez dos cadeados na necessidade de
perder as pernas embaixo dos lençóis

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